
O nosso império mais real foi o dos mares que não são estanques mas móveis e profundos, e o prémio mais alto cuja atribuição Camões reconheceu aos Portugueses foi o da Ilha dos Amores, aliás toda ela entretecida nas malhas do reino marinho. Vivemos mais do encanto da descoberta que da força do domínio. A beleza é para nós por si só uma paga e não é o império da afirmação que mais conta.
É talvez por isso que o Oriente entende melhor a nossa verdadeira face, como se ele fora o sudário natural da nossa História. Quando um poeta oriental diz que “não é a flor da cerejeira que é bela mas o momento em que vai murchar”, parece-nos surpreender a mesma desinteressada generosidade da beleza como descoberta, aventura e risco que perpassa pela nossa História e melhor se desvenda quando parece que a nossa presença se desvanece. Quando tudo é História, a recompensa parece continuar a ser sobretudo essa.
Era esta já a lição de Camões, o herói do espírito que o 10 de Junho evoca e comemora. Uma lição que não foi apenas a de pensar e escrever em português, mas a do viver em português. Porque, de facto, a cultura portuguesa é, sobretudo, uma cultura da vida, uma cultura da experiência, uma cultura do humano e da experiência humana. A grande obra cultural portuguesa é de um certo tipo de sociedade e a de um certo modo de viver. Melhor o compreendemos hoje forçosamente quando o nosso império são “Os Lusíadas”, um livro afinal, ou, por extensão, uma História e uma Cultura de que os homens são quem resta e assegura o futuro. Hoje, pelo menos, podemos sem nenhuma afectação política, defensiva ou ofensiva. ser por inteiro senhores do Império dessa Cultura e dessa História, ambas, como “Os Lusíadas”, ao mesmo tempo viagem de um povo e viagem de todo o conhecimento humano. (...)
Nós perseguimos como sempre o nosso rasgo de universalismo, o único capaz de nos transportar e para o qual qualquer europeísmo fechado ou incondicional, ainda que integrado, não seria senão uma espécie, ainda que rica, de provincianismo! Mesmo na Europa não podemos ser apenas europeus. Só olhando ecumenicamente nos não tornaremos cegos. O problema, por isso, não é tanto o de nos adaptarmos à Europa, mas o de entrar nela originalmente, isto é, à nossa maneira e com o lastro de universalidade que trazemos. (...)
É claro que o rasgo de universalismo já não aspira a descobrir ou conquistar as terras e os mares, mas sobretudo ao movimento solidário das culturas e ideias, nomeadamente no quadro de uma língua como a nossa. Somos uma cultura europeia, mas, ao mesmo tempo, transeuropeia e só como tal nos podemos incorporar com autonomia na história do tempo presente e, inclusivamente, na história da própria Europa. A nossa língua torna-nos imediatamente transparente uma grande parte do mundo em toda a parte e é sintomático que o que tenha ficado das nossas relações com os novos países independentes de língua portuguesa seja sobretudo um meio de entendimento.
Trocámos justamente um Império por uma ideia mais generosa na vida em comum, tanto na vida interna como na internacional. Mas foi mais uma conversão do que uma troca. Agora a ideia do Império deve converter-se no Império da Ideia, isto é, num país que possa pensar-se e realizar-se a si e à sua história com um sentido idêntico e fecundo, mas na nova história do Futuro. Agora na perspectiva do ser português e não só na de ter Portugal! (...)
É talvez por isso que o Oriente entende melhor a nossa verdadeira face, como se ele fora o sudário natural da nossa História. Quando um poeta oriental diz que “não é a flor da cerejeira que é bela mas o momento em que vai murchar”, parece-nos surpreender a mesma desinteressada generosidade da beleza como descoberta, aventura e risco que perpassa pela nossa História e melhor se desvenda quando parece que a nossa presença se desvanece. Quando tudo é História, a recompensa parece continuar a ser sobretudo essa.
Era esta já a lição de Camões, o herói do espírito que o 10 de Junho evoca e comemora. Uma lição que não foi apenas a de pensar e escrever em português, mas a do viver em português. Porque, de facto, a cultura portuguesa é, sobretudo, uma cultura da vida, uma cultura da experiência, uma cultura do humano e da experiência humana. A grande obra cultural portuguesa é de um certo tipo de sociedade e a de um certo modo de viver. Melhor o compreendemos hoje forçosamente quando o nosso império são “Os Lusíadas”, um livro afinal, ou, por extensão, uma História e uma Cultura de que os homens são quem resta e assegura o futuro. Hoje, pelo menos, podemos sem nenhuma afectação política, defensiva ou ofensiva. ser por inteiro senhores do Império dessa Cultura e dessa História, ambas, como “Os Lusíadas”, ao mesmo tempo viagem de um povo e viagem de todo o conhecimento humano. (...)
Nós perseguimos como sempre o nosso rasgo de universalismo, o único capaz de nos transportar e para o qual qualquer europeísmo fechado ou incondicional, ainda que integrado, não seria senão uma espécie, ainda que rica, de provincianismo! Mesmo na Europa não podemos ser apenas europeus. Só olhando ecumenicamente nos não tornaremos cegos. O problema, por isso, não é tanto o de nos adaptarmos à Europa, mas o de entrar nela originalmente, isto é, à nossa maneira e com o lastro de universalidade que trazemos. (...)
É claro que o rasgo de universalismo já não aspira a descobrir ou conquistar as terras e os mares, mas sobretudo ao movimento solidário das culturas e ideias, nomeadamente no quadro de uma língua como a nossa. Somos uma cultura europeia, mas, ao mesmo tempo, transeuropeia e só como tal nos podemos incorporar com autonomia na história do tempo presente e, inclusivamente, na história da própria Europa. A nossa língua torna-nos imediatamente transparente uma grande parte do mundo em toda a parte e é sintomático que o que tenha ficado das nossas relações com os novos países independentes de língua portuguesa seja sobretudo um meio de entendimento.
Trocámos justamente um Império por uma ideia mais generosa na vida em comum, tanto na vida interna como na internacional. Mas foi mais uma conversão do que uma troca. Agora a ideia do Império deve converter-se no Império da Ideia, isto é, num país que possa pensar-se e realizar-se a si e à sua história com um sentido idêntico e fecundo, mas na nova história do Futuro. Agora na perspectiva do ser português e não só na de ter Portugal! (...)
(artigo no Diário de Notícias, 20 de junho de 1982)